Eu sei por que o pássaro canta na gaiola – Maya Angelou


Eu poderia começar essa resenha dizendo “pare tudo que está lendo agora e corra para essa obra de Angelou”. Talvez fosse apropriado, levando em consideração como ela me transformou como leitor nos mais de trinta dias que passei ao lado dessa garotinha Maya, conhecendo sua intimidade, seus desejos, suas subjetividades, medos, anseios, sonhos. 

Mas temo que seja apressado começar com essa imposição, porque acredito que esse livro encontra o leitor certo na hora certa. Ao menos foi assim comigo. Ele passou tempos e tempos na minha estante até que esse encontro fosse possível – me oferecendo circunstâncias reais e apropriadas para apreciá-lo como ele merece.

No poderoso romance autobiográfico, a autora, tão conhecida pela sua luta contra o racismo e pelos direitos de pessoas negras, nos oferta uma versão sua rememorada, revisitada com uma poética autoral impressionante, potente e única. Aqui, Maya se desnuda nas páginas, tal qual uma menina que se põe vulnerável nas mãos do leitor.

De sua infância ao lado do avô, tio e irmão – Bailey aqui desempenhando um papel fundamental – à sua adolescência, os passos percorridos, capítulo a capítulo, precisam ser dados com reticência, pois as punhaladas da memória nos colocam no centro dessa narrativa que é, ao tempo, reflexiva, doce, dolorosa, amável e, acima de tudo e sendo redundante, transformadora. 

E posso dizer sem hesitação: você não sairá do mesmo jeito. O modo como é contada, como habilmente Maya manuseia suas palavras, escolhendo-as precisamente, toca, abre e expande o leitor. Mas também é preciso dizer que carece de tempo para adentrar nas camadas. Não é uma leitura ‘fácil’ ou rápida, é necessário tato para também se deixar tocar por tudo que acontece – no tempo presente da memória as coisas funcionam assim.

Depois de tudo não parece impossível não voltar ao começo dessa resenha e reafirmar “pare tudo que está lendo agora e corra para essa obra”. Espero, sinceramente, que esse impulso surja naturalmente, que você queira e esteja para Maya Angelou. Ela tem muito a dizer e nós temos muito a escutar.
Boa leitura!

Racismo. Abuso. Libertação.

A vida de Marguerite Ann Johnson foi marcada por essas três palavras. A garota negra, criada no sul por sua avó paterna, carregou consigo um enorme fardo que foi aliviado apenas pela literatura e por tudo aquilo que ela pôde lhe trazer: conforto através das palavras.

Dessa forma, Maya, como era carinhosamente chamada, escreve para exibir sua voz e libertar-se das grades que foram colocadas em sua vida. As lembranças dolorosas e as descobertas de Angelou estão contidas e eternizadas nas páginas desta obra densa e necessária, dando voz aos jovens que um dia foram, assim como ela, fadados a uma vida dura e cheia de preconceitos.

Com uma escrita poética e poderosa, a obra toca, emociona e transforma profundamente o espírito e o pensamento de quem a lê.


4 comentários

  1. Esta frase impactante pra mim já é suficiente para me fazer parar tudo e ler o livro:

    “pare tudo que está lendo agora e corra para essa obra de Angelou”

    Eu realmente estou num momento de leituras mais "adultas", mais fortes e que me ensinem e me transmitam algo. Digamos que eu agora seja a leitora certa na hora certa. Não quero sair a mesma desta leitura, definitivamente.

    Parabéns pela excelente resenha.

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  2. Olá! Só com esse título e essa capa já deu vontade de largar e tudo e se jogar na leitura, daí lendo a resenha deu para perceber que essa sensação não a acontece à toa, mais uma vez temos aqui aquele tipo de leitura que por mais que não seja fácil e nos mostre uma verdade que incomoda, machuca, mas que também nos fazer refletir sobre as muitas injustiças que ainda acontece. Fiquei bem curiosa para saber mais da história dessa melhor, pois sem dúvida, há de ser inspirador.

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  3. Sim, esse livro é tão intenso, mas tão intenso que até hoje, nunca li nada negativo sobre ele. A escrita da autora é assim, nos pega pela mão e literalmente nos empurra do penhasco.
    Eu ainda não tive a obra de fato em mãos, mas li e leio tanto sobre ela, que parece que abracei cada personagem.
    Espero sim, ler em breve!
    Beijo

    Angela Cunha Gabriel/Rubro Rosa/O Vazio na flor

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  4. Ronaldo!
    Poder saborear lentamente uma história baseada na própria vida da autora e com a intensidade dos sentimentos que ela impingiu em suas palavras, deve ser algo transformador de alguma forma, pelo menos na nossa forma de encarar assuntos tão importantes como racismo, abuso e finalmente, a libertação.
    cheirinhos
    Rudy

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