As coisas andam meio desalmadas – Thainá Carvalho


Tocar a natureza do outro, apalpar as várias humanidades, fazer carinho da alma do mundo. Como falar de poesia? Como escrever sobre o pedaço do outro? “Resenhar” livros de poemas é sempre um desafio: cada escritor, em sua própria subjetividade, pousa sobre o papel suas experimentações – e todas válidas, necessárias, por vezes terapêuticas, mas sempre fundamentais (e fundamentalmente profundas; ao menos, de alguma forma).

Thainá dispõe cada poesia como se numa ânsia de costurar partes de um todo que é universalizado e individual. A “desalma” das coisas consta exatamente em um resgate, uma busca por respostas que logo, admitimos nós e ela, se torna longínqua, uma viagem odisseica que nos permite inúmeros encontros.

O livro é encantador do começo ao fim. E incômodo, provocativo, tão necessário quanto este verso, na poesia metalinguística “toda palavra é necessária, do grito ao carinho”. E esse grito que amedronta é abafado pelo carinho, que, não menos agressivo, também causa pavor.

A poesia de Thainá toca nossa pele, nossos tecidos, se emaranha em nossas veias – a literalidade do que é visceral. Cada camada/poesia, cada verso/vida se torna uma descoberta no ato: causa surpresa, aquece, nos mergulha, e mergulhamos nós nelas. 

No súbito, me encontrei em cada palavra precisa. E, na surpresa de me ver tão exposto (porque, geralmente, poesias me causam essa sensação de exposição), me vi como um sujeito para além de mim. Parecia-me, de repente, “pego no flagra” da vida: com minhas cicatrizes, medos, inquietações, amores, contemplações.

“As coisas andam meio desalmadas” é, também, um convite a nós mesmos para encontrar o lúdico da vida; para explorar as imagéticas do mundo, observar do céu, ao grão de areia. E que forma bonita de viver e ser a escrita!

Leiam poesia! Leiam Thainá!

As coisas andam meio desalmadas… mas nem tanto: A poesia molecular de Thainá Carvalho Dividido em duas partes, é um convite a tocarmos os signos que palpitam sob o universo das coisas aparentemente desalmadas. Com uma melodia contemporânea, incorporada pelas variações rítmicas às quais nossos corpos, pensamentos e sensações são submetidos diariamente, os poemas nos levam ao centro de um cotidiano em que o eu poético evoca um corpo que é, mas nem sempre está, o que inevitavelmente desalma tudo ao redor. Na segunda parte, os poemas parecem trazer à luz a possibilidade de uma vivência plena, quase cósmica, com tudo à nossa volta e dentro de nós. Poemas que falam de memória, presença e do corpo como terra, sexo, amor e morte-vida. Com uma escrita moderna, no sentido mais vívido da palavra, Thainá consegue, com cristalina melancolia, nos dar gotas preciosas da experiência de um corpo (re)integrado à vida





4 comentários

  1. Ronaldo!
    Sou leitora voraz de poesias e gosto também de escrevê-las quando vem a inspiração, e, soube descrever perfeitamente o que os poemas fazem conosco ao lermos, toda subjetividade está lá e cabe ao leitor uni-las com suas vivências e ver até que ponto elas mexem com nossa sensibilidade e nos identificam em certas situações.
    Anotado, obrigada.
    cheirinhos
    Rudy

    ResponderExcluir
  2. Eu amo poesia! Sou do tipo que uma frase mais poética já me faz sorrir. Estamos vivendo tempos difíceis, onde uma palavra vale um abraço e isso é algo que só a poesia nos oferece, pois traz um pedaço imenso da alma de quem desenhou as letras!
    Como ainda não conhecia as letras de Thaina, já preciso muito sentir tudo isso e sim, olhar com mais carinho a mim e aos demais!
    Beijo

    Angela Cunha Gabriel/Rubro Rosa/O Vazio na Flor

    ResponderExcluir
  3. Olá! Acho que é por conta de todos esses sentimentos que esse tipo de livro nos proporciona é que ele deveria ser lido por todos. Se identificar com a leitura é tão único que vale demais até mesmo os incômodos que isso pode gerar.

    ResponderExcluir
  4. Olá Ronaldo
    Que linda á sua resenha .
    O que escrever depois disso ?acho tão incrível as pessoas que tem o dom de transportar para o papel emoções. Emoções profundas em poucos versos .em poucas palavras Parece que a autora vai fundo no nosso âmago, no nosso interior .
    Sim o mundo precisa de poesias .
    Eu preciso ler mais poesias. Porque é maravilhoso .Mas a gente esquece. Deixa para lá. Náo dá a devida importância infelizmente.

    ResponderExcluir

Seu comentário é sempre bem-vindo e lembre-se, todos serão respondidos.
Portanto volte ao post para conferir ou clique na opção "Notifique-me" e receba por email.
Obrigada!