O blog Sempre Romântica tem o prazer de apresentar a mais nova colunista do blog, a autora Laís R. de Oliveira. A partir de hoje, e provavelmente uma ou duas vezes por mês, teremos aqui a presença da Laís com uma resenha inédita e fresquinha, especialmente para você leitor, amigo e seguidor do blog.
E para abrir com chave de ouro temos a resenha da Trilogia “A Primeira Lei” - O Poder da Espada, de Joe Abercrombie. Espero que todos gostem.
Nota: O foco da resenha é o primeiro livro da série, “O Poder da Espada”. Entretanto, falarei minhas impressões gerais da trilogia também. E não se preocupem: zero de spoiler!
Sand dan Glokta é um carrasco implacável a serviço da Inquisição de Sua Majestade. Por ironia, Glokta é um ex-prisioneiro de guerra que passou dois anos sob tortura.
Mas isso nunca teria acontecido se dependesse de Logen Nove Dedos. Ele jamais deixaria um inimigo viver tanto tempo.
Já a felicidade do jovem e mulherengo Jezal dan Luthar seria alcançar fama e glória vencendo o Campeonato de esgrima, para depois ser recompensado com um alto cargo no governo que lhe permitisse jamais ter um dia de trabalho pesado na vida. Mas há uma guerra iminente e ele pode ser convocado a qualquer momento.
Enquanto a União mobiliza seus exércitos para combater os inimigos externos, internamente se formam conspirações sanguinárias e um homem se apresenta como o lendário Bayaz, o Primeiro dos Magos, retornando do exílio depois de séculos. Quem quer que ele seja, sua presença tornará as vidas de Glokta, Jezal e Logen muito mais difíceis. Agora a linha que separa o herói do vilão pode ficar tênue demais.
Estrutura do enredo:
Somos apresentados, inicialmente, a três ambientes diferentes, com três protagonistas bem distintos um do outro. Logo no início, ficamos meio perdidos com todas as novidades introduzidas por Abercrombie: mundos novos, seres novos, personagens complexos (algo que dá para perceber desde a primeira página), zero de contextualização. E, como sempre ocorre em fantasias medievais, temos altas doses de segredos, mentiras, traições e... guerras. Muitas guerras, sejam elas iminentes, contra autoproclamados imperadores, ou até mesmo as mais comuns, guerras de poder e de ego.
Sobre o funcionamento das sociedades do mundo de Abercrombie, acho que nada pode descrevê-lo melhor que o trecho a seguir:
À medida que as estórias paralelas avançam, elas vão se cruzando, o leitor vai se encontrando, as ligações vão sendo estabelecidas, os segredos vão se aprofundando, e novos personagens (cada um mais maravilhoso e louco que o outro) vão surgindo de forma inesperada.
Apesar de não ter o instinto tão assassino quanto o de George R.R. Martin, Abercrombie nos surpreende a cada cena (especialmente as de tortura, não recomendadas para quem tem estômago fraco). Não há diálogos desnecessários ou trechos inúteis. Certos momentos podem não ser compreendidos quando lidos, mas terão relevância em algum momento da trilogia. Cada livro é melhor e consegue te prender ainda mais que o anterior, e a tradução para o português mantém a fluidez e qualidade da escrita do autor.
O conjunto desses elementos torna a obra de Abercrombie dinâmica e viciante. A sinopse pode não ser das mais atrativas: longa demais e meio monótona. No entanto, a trilogia é o oposto! Como George R.R. Martin diz, “você não conseguirá parar de virar as páginas.”
Personagens:
Intensos, aflitivos e com um toque de sadismo (alguns mais que outros). Talvez pela formação em psicologia, Abercrombie cria personagens completamente diferentes e, ao mesmo tempo, que se complementam no todo, cujas atitudes, por vezes, fazem as nossas entranhas virar do avesso e depois, revirar.
O nível de complexidade e o histórico de cada personagem são relatados aos poucos, às vezes de maneira sutil, outras como um tapa na cara. O autor acertou em cheio no número de personagens e na variedade de personalidades. No entanto, se tem algum defeito no livro, é o excesso de testosterona. Por mais que a guerra esteja em cada esquina no mundo da saga, senti falta da presença feminina. Por mais que as – poucas – mulheres da série sejam simplesmente incríveis, poderiam ser mais, sem sombra de dúvida.
Vou mencionar aqui os três principais protagonistas do primeiro livro da série, “O Poder da Espada”:
Logen Nove Dedos: típico guerreiro medieval, com jeito bruto e coração grande, com lealdade ao grupo e uma estória repleta de perdas, lutas e cicatrizes. O homem do norte frio e inóspito, com boas doses de Ned Stark (porém muito mais bruto, principalmente pela perda de toda a família).
No entanto, apesar de parecer “homem comum” para esse gênero literário, Logen nos surpreende, em especial quando seu lado “Nove Sangrento” vem à tona.
Jezal Dan Luthar: metido, engomadinho, fresco, elitista, arrogante... Precisa de mais? Em muitos momentos, o leitor tem vontade de socar o queixo do – intragável – aristocrata, cuja família “comprou” seu lugar no exército. Mas não se preocupem: como diz o ditado, “quanto mais alto o voo maior o tombo”...
Sand dan Glokta: o meu favorito. Posso afirmar que é um dos meus favoritos de todos os tempos, o que me preocupa um pouco, por se tratar de um torturador implacável sem misericórdia ou empatia. Mesmo assim, tem algo nele – talvez seu sarcasmo impecável ou seu humor negro espetacular – que faz o leitor simplesmente se apaixonar pelo psicopata. Pode parecer também um personagem típico: o torturado que se tornou torturador. Porém, posso garantir: não há nada de “comum” em Glokta!
Quem é Joe Abercrombie?
Abercrombie nasceu em Lancaster, Inglaterra. Ele estudou psicologia na Universidade de Manchester. Atualmente mora em Bath com a esposa, as duas filhas e o filho. Foi editor freelancer de filmes, trabalhando em diversos documentários e eventos musicais, mas hoje se dedica a escrever.
Somos apresentados, inicialmente, a três ambientes diferentes, com três protagonistas bem distintos um do outro. Logo no início, ficamos meio perdidos com todas as novidades introduzidas por Abercrombie: mundos novos, seres novos, personagens complexos (algo que dá para perceber desde a primeira página), zero de contextualização. E, como sempre ocorre em fantasias medievais, temos altas doses de segredos, mentiras, traições e... guerras. Muitas guerras, sejam elas iminentes, contra autoproclamados imperadores, ou até mesmo as mais comuns, guerras de poder e de ego.
Sobre o funcionamento das sociedades do mundo de Abercrombie, acho que nada pode descrevê-lo melhor que o trecho a seguir:
“As pessoas daqui nasceram em suas castas. Eles têm plebeus para lutar, cultivar a terra e trabalhar. Têm a burguesia para comerciar, construir e pensar. Têm a nobreza para possuir a terra e dar ordens aos outros. Têm a realeza... esqueci exatamente para quê.”
P. 238
À medida que as estórias paralelas avançam, elas vão se cruzando, o leitor vai se encontrando, as ligações vão sendo estabelecidas, os segredos vão se aprofundando, e novos personagens (cada um mais maravilhoso e louco que o outro) vão surgindo de forma inesperada.
Apesar de não ter o instinto tão assassino quanto o de George R.R. Martin, Abercrombie nos surpreende a cada cena (especialmente as de tortura, não recomendadas para quem tem estômago fraco). Não há diálogos desnecessários ou trechos inúteis. Certos momentos podem não ser compreendidos quando lidos, mas terão relevância em algum momento da trilogia. Cada livro é melhor e consegue te prender ainda mais que o anterior, e a tradução para o português mantém a fluidez e qualidade da escrita do autor.
O conjunto desses elementos torna a obra de Abercrombie dinâmica e viciante. A sinopse pode não ser das mais atrativas: longa demais e meio monótona. No entanto, a trilogia é o oposto! Como George R.R. Martin diz, “você não conseguirá parar de virar as páginas.”
Personagens:
Intensos, aflitivos e com um toque de sadismo (alguns mais que outros). Talvez pela formação em psicologia, Abercrombie cria personagens completamente diferentes e, ao mesmo tempo, que se complementam no todo, cujas atitudes, por vezes, fazem as nossas entranhas virar do avesso e depois, revirar.
O nível de complexidade e o histórico de cada personagem são relatados aos poucos, às vezes de maneira sutil, outras como um tapa na cara. O autor acertou em cheio no número de personagens e na variedade de personalidades. No entanto, se tem algum defeito no livro, é o excesso de testosterona. Por mais que a guerra esteja em cada esquina no mundo da saga, senti falta da presença feminina. Por mais que as – poucas – mulheres da série sejam simplesmente incríveis, poderiam ser mais, sem sombra de dúvida.
Vou mencionar aqui os três principais protagonistas do primeiro livro da série, “O Poder da Espada”:
Logen Nove Dedos: típico guerreiro medieval, com jeito bruto e coração grande, com lealdade ao grupo e uma estória repleta de perdas, lutas e cicatrizes. O homem do norte frio e inóspito, com boas doses de Ned Stark (porém muito mais bruto, principalmente pela perda de toda a família).
“Fazia tanto tempo que Logen não ficava limpo que havia se esquecido da sensação. Suas roupas novas eram ásperas de encontro à pele sem a cobertura usual de sujeira, gordura e suor seco.”
P. 132
No entanto, apesar de parecer “homem comum” para esse gênero literário, Logen nos surpreende, em especial quando seu lado “Nove Sangrento” vem à tona.
Jezal Dan Luthar: metido, engomadinho, fresco, elitista, arrogante... Precisa de mais? Em muitos momentos, o leitor tem vontade de socar o queixo do – intragável – aristocrata, cuja família “comprou” seu lugar no exército. Mas não se preocupem: como diz o ditado, “quanto mais alto o voo maior o tombo”...
“Não conseguia imaginar um motivo para que um oficial se mostrasse tão afável com soldados comuns. Além disso, o sujeito tinha cicatrizes e era feio. Jezal não via utilidade em pessoas feias.”
P. 62
Sand dan Glokta: o meu favorito. Posso afirmar que é um dos meus favoritos de todos os tempos, o que me preocupa um pouco, por se tratar de um torturador implacável sem misericórdia ou empatia. Mesmo assim, tem algo nele – talvez seu sarcasmo impecável ou seu humor negro espetacular – que faz o leitor simplesmente se apaixonar pelo psicopata. Pode parecer também um personagem típico: o torturado que se tornou torturador. Porém, posso garantir: não há nada de “comum” em Glokta!
“Ah, que vida dura. Capanga e torturador é um verdadeiro avanço para você, não? Todo homem tem suas desculpas e, quanto mais vil o homem se torna, mais tocante precisa ser a história. Qual será a minha história agora?”
P. 148
Quem é Joe Abercrombie?
Abercrombie nasceu em Lancaster, Inglaterra. Ele estudou psicologia na Universidade de Manchester. Atualmente mora em Bath com a esposa, as duas filhas e o filho. Foi editor freelancer de filmes, trabalhando em diversos documentários e eventos musicais, mas hoje se dedica a escrever.
LRDO - Laís nasceu em Salvador, em 1986. Ainda adolescente, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde fez faculdade e mestrado em Direito. Atualmente, trabalha em Brasília em uma multinacional como Gerente de Relações Internacionais. Começou a escrever em 2013, mesmo ano em que desenvolveu o blog de cinema LRDO. É também colaboradora do blog Mulheres Ventaneras, onde escreve contos. Amante de literatura clássica e grande fã de Jane Austen, Laís lançou este ano o livro Primeiras Impressões, uma adaptação moderna de Orgulho e Preconceito.
Ei meninas
ResponderExcluirEu li para o evento foi As mentiras de Locke Lamora, mas fiquei com muita vontade de ler essa trilogia depois da Márcia falar no evento. Adorei saber mais sobre ele.
bjs
Já tinha ouvido falar desse livros e confesso que torci o nariz para essa leitura mas agora confesso que fiquei com vontade de lê-los. Só pra conhecer esse Logen Nove Dedos...
ResponderExcluirBem vinda Laís!
ResponderExcluirJá tinha ouvido falar sobre a belíssima adaptação que ela fez no livro Minhas impressões.
Falando da resenha, gosto muito quando as personagens tem o aspecto mais psicológico bem descritos no livro, pois com formação em psicologia, não poso me abster de analisar as personagens (coisa de leitora analítica..kkk).
Gosto das ficções e quando trazem uma realidade bem adversa, ainda mais.
A série deve mesmo ser boa.
Parabéns pela análise!
“Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.” (Clarice Lispector)
Cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/